segunda-feira, 18 de abril de 2011
Review: Eureka Seven
Eureka seven trata de mechas. Mas não como Gundam, onde os bichos são o foco da ação 100% do tempo. Nem como Evangelion, onde os dramas pessoais afloram e até eclipsam as máquinas. Nessa série, uma harmonia de estilos raramente alcançada foi conseguida. A história começa numa cidade pacata em um mundo aparentemente fictício, onde o protagonista, Renton, vive reclamando de sua vida. "Isso aqui é muito chato" será sua frase mais ouvida e, com certeza, arrancará gargalhadas dos menos sisudos. Ou seja, o anime te desarma desde o primeiro momento. E isso é importante, pois o começo do anime, excetuando o primeiro episódio, é responsável pelos poucos defeitos da série.
Renton sonha em "surfar". Entretanto, no mundo de Eureka seven, "surfar" é usar uma prancha para voar nas ondas Trappar. Trappar é uma espécie de energia emanada por todo o planeta (similar ao "lifestream" de Final Fantasy VII para quem já viu), e "sentir" essas ondas é uma habilidade explorada para diversão e para a guerra. Um fenômeno raro gerado pelo Trappar são as Coralians, entidades intituladas auto-conscientes e base dos muitos mistérios explorados ao longo da obra. Logo ao fim desse primeiro episódio, cai de bandeja na casa de Renton um LFO (Light Finding Operation), o mecha desse mundo, e dentro dele está Eureka, perseguida por militares e imediatamente eleita como a garota dos sonhos de Renton. É importante abrir aqui um parêntese: ao contrário dos romances bobinhos e sem embasamento de vários animes, aqui a coisa rola tão naturalmente desde o primeiro momento que fica difícil não ser cativado pela relação inocente e séria de Renton com Eureka. Sem firulas, definitivamente um dos mais bem elaborados casais da história dos animes.
Bem, o LFO em questão é o Nirvash Type Zero, uma unidade primordial escavada em ruínas antigas. Eureka é mantida sob a égide do Gekko State, uma nação independente formada dentro de uma nave de última geração comandada pelo herói revolucionário ídolo de 10 em cada 10 adolescentes do mundo: Holland. O Gekko State conseguiu a simpatia de muitos através de uma publicação, a "Ray=out", que contesta muito do que é dito pela mídia mundial. Após algumas idas e vindas, Renton acaba se unindo ao Gekko State e descobrindo que lá dentro precisará sobreviver, ao contrário da realidade romanceada pela revista que os retrata como aventureiros.
Entre perseguições militares, missões de resgate, fugas de casa, adoções de famílias e muitas reviravoltas, descobrimos que Renton e o amor que ele sente por Eureka terão um papel muito maior no desenrolar da história do que se poderia imaginar. E é preciso frisar que muito da qualidade de Eureka se deve ao grupo de personagens e suas relações. Seriamente falando, não consigo me lembrar de um grupo tão carismático e fora dos padrões estereotipados dos animes quanto este. Todos os membros do Gekko State são cidadãos do mundo, uma miscelânea de raças, cores, credos e personalidades como nunca se viu. Tem até um que é a cara do Che Guevara (apesar de menos duro que o real). Entre os antagonistas, posso citar Dominique e Anemone, sobre os quais não posso revelar muito sem estragar o fim, mas posso adiantar que servem como contraparte a Eureka e Renton, usando o Type TheEND, um mecha tão poderoso quanto o Type Zero. Sob o comando direto de Dewey Novak, que serve ao conselho dos Sábios (a mais alta autoridade mundial) em determinados momentos eles demonstram ainda mais carisma que a turma do Gekko State.
O roteiro de Eureka seveN é impecável. Não há do que reclamar aqui, as informações ficam claras, as revelações surpreendem, personagens novos são adicionados no momento certo. Já o fluxo narrativo deixa um pouco a desejar nas partes iniciais. Com a intenção de deixar o publico no escuro, certas informações são omitidas, e o que deveria criar curiosidade acaba irritando um pouco. Felizmente, lá pelo episódio 10 a coisa começa a fluir de uma maneira tão agradável que você mal toma fôlego antes de chegar no 50, que encerra a série.
Tecnicamente, a série é bem acabada, mesmo para o padrão atual. Algumas sequências de batalha são inventivas ("à la" Samurai Champloo), mesmo envolvendo mechas e aeronaves. Outras são clichês batidos, mas tão bem executados que empolgam, e muito. Os 5 episódios finais são um show à parte, e quando termina você pensa: "queria mais, mas se fizessem isto estragariam". A animação é tudo que se espera do estúdio Bones e a paleta de cores combina com o clima ameno da série, que apesar de ser séria em muitos momentos, não é cruel com o público (como o Hideaki Anno parece adorar ser). A trilha sonora teve uma única escolha equivocada em minha opinião, que foi a segunda abertura do anime, mas de resto cumpre o seu papel e, em dados momentos, desencanta.
Algumas questões mais sérias e alusivas ao nosso mundo atual são tratadas, como a influência da mídia, intolerância religiosa, ética médica, descuido ambiental e outras tão pertinentes quanto, mas sem focalizar os temas muito de perto, permitindo que você reflita sem se perder. O interessante é ver os personagens do anime encarando isso como nós o fazemos em nosso dia-a-dia, e fazendo o que podem diante das circunstâncias, gente como a gente. Algo que gera uma identificação imediata.
Finalizando, a nota dada é a máxima, pois mesmo sofrendo de alguns defeitos, as qualidades são tantas que as falhas se perdem entre elas. A cada ano a impressão que se tem é que o número de boas séries (boas de verdade) diminui. Eureka seveN prova que ainda tem espaço pro trabalho autoral aliado ao entretenimento nos animes. Além disso, mesmo sendo uma série de mechas, com um enredo complexo (como é comum no estilo) essa daqui facilmente agrada a todos, tendo humor, romance, ação, reviravoltas, história e animação de qualidade. Tudo na medida certa.
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